“Nada é. Tudo está.”

14/04/2012

19 verdades sobre a prisão de ventre

O tão conhecido problema de 'intestino preso' afeta 15% dos brasileiros, em geral mulheres. Mas, na maioria dos casos, a dificuldade em 'fazer o número 2' não é causada por razões médicas e sim sociais

 

Um em cada sete brasileiros tem dificuldade de ir ao banheiro. São quase 30 milhões sofrendo com a chamada constipação intestinal, ou simplesmente prisão de ventre. As principais vítimas (75%) são mulheres. Os números ajudam a entender por que o intestino preso é a queixa isolada mais freqüente nos consultórios do gastroenterologista.

Apesar da popularidade do assunto, ainda há muitas dúvidas até entre os atormentados pelo desajuste intestinal há anos. Muitos relatam gastar fábulas de dinheiro em dietas, laxantes e consultas, e garantem que nada funciona.

Resultado: os mitos acabam prejudicando o diagnóstico e o tratamento. As pessoas tomam laxante só porque não conseguem evacuar todo dia. "E isso é um erro", garante o cirurgião e coloproctologista Paulo José Pereira de Campos Carvalho, coordenador do Núcleo de Fisiologia Gastrintestinal do Hospital Albert Einsten (SP) e integrante do Control (Centro de Estudos das Disfunções Urinárias e de Evacuação do Hospital São Luiz, SP). "Cada um tem seu tempo de trânsito intestinal para transformar o alimento em fezes e evacuar", diz o médico. O gastroenterologista Flávio Antonio Quilici, professor da Faculdade de Ciências Mé dicas da Pontifícia Universidade Ca - tó lica de Campinas (PUCC), concorda e acrescenta. "A constipação só se caracteriza se o indivíduo evacua menos de três vezes por semana".

Além disso, há o uso indiscriminado de remédios. "Os laxantes tornam-se cada vez menos eficazes, e a pessoa passa a tomar doses mais altas, agravando o quadro", garante a professora Maria do Carmo Friche Passos, da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Para desmitificar o assunto, Viva Saúde consultou alguns dos principais especialistas no distúrbio. Confira, a seguir, 19 revelações sobre esse incômodo que causa dores, inchaço na barriga, gases e até mau humor.

1. Não é só porque você não consegue evacuar todos os dias que sofre de prisão de ventre.
A constipação intestinal é caracterizada por uma diminuição da freqüê n - cia de evacuações acompanhada por fezes ressecadas e endurecidas. Mas só tem a doença quem vai ao banheiro menos de três vezes por semana. Uma outra boa referência para identificar se há ou não a constipação é o tipo de fezes, que normalmente precisam ser pastosas, não-fragmentadas e umedecidas. Se elas apresentarem esse aspecto, mesmo que a evacuação ocorra de três em três dias, a pessoa não deve se preocupar. Já os que vão ao banheiro diariamente e fazem o chamado "cocô de cabrito", possivelmente têm o intestino preso.

2. O intervalo entre as idas ao banheiro varia entre os sexos.
Nos homens, esse tempo é de 30 horas em média e nas mulheres, de 40 a 60 horas. Mas isso varia conforme o tamanho do intestino, a sua força de contração e a dieta alimentar de cada um. O intervalo das mulheres costuma ser maior, porque a força de contração intestinal delas é menor.

3. O 'intestino preso' é um mal que atinge mais as mulheres.
Sim. Elas têm digestão e trânsito intestinal naturalmente mais lentos, por questões hormonais. Mas o principal motivo para a diferença é cultural. Como as mulheres são educadas desde cedo a não evacuar e nem soltar gases em locais "inapropriados", muitas desenvolvem a chamada síndrome da obstrução de saída.
Se a pessoa deixa de evacuar quando o corpo pede, a vontade passa e as fezes ficam mais tempo do que deveriam no intestino grosso. O bolo fecal perde água, resseca, endurece e aí fica difícil de ser eliminado. Com o tempo, o hábito de contrair-se, mesmo antes de ter a vontade de ir ao banheiro, inibe o reflexo espontâneo de abertura do ânus e esta ação involuntária desaparece, tornando a evacuação cada vez mais difícil.

4. É preciso resgatar o reflexo natural, indo ao banheiro sempre que der vontade. Caso contrário, as dificuldades para evacuar se manterão. E pior: o esforço ao longo dos anos poderá levar à incontinência fecal na velhice.

5. Achar que nada resolve o problema de prisão de ventre é pura falta de informação. Isso vale também para os médicos. Muitos não dão a importância que deveriam ao problema e prescrevem laxantes de forma indiscriminada, agravando a situação. O efeito do laxante parece com o de uma diarréia, o que significa que, após a eliminação de tudo o que estava no intestino, é natural que o corpo precise de alguns dias para produzir novas fezes. O paciente então entra em um círculo vicioso: toma laxante, porque acha que tem o intestino preso; e fica com o intestino preso, porque toma laxante!
Por isso é fundamental que o diagnóstico seja mais preciso e as pessoas entendam que reeducar o intestino depois de anos travando a evacuação requer tempo e dedicação.
6. Intestino preso é diferente de síndrome do intestino irritável.
Sim. Na constipação intestinal mais comum, que é a funcional (motiva da por dieta inadequada, uso de laxantes e contração dos estímulos involuntários de evacuação), a pessoa apresenta dificuldade para ir ao banheiro, produz fezes endurecidas ou fragmentadas, tem de se esforçar para defecar e pode sentir dor no momento da evacuação. Já na síndrome do intestino irritável o indivíduo apresenta dor no abdômen inferior, aumento do volume da barriga e alterações intestinais. Estas alterações, aliás, podem ser diferentes: prisão de ventre, diarréia ou ocorrência alternada de ambas. Ou seja, a prisão de ventre é apenas um sintoma da síndrome do instestino irritável.

7. Sensação de evacuação incompleta é prisão de ventre.
Verdade. Os sintomas mais importantes e comuns da prisão de ventre são dores ao evacuar, sangramento causado pelas fezes endurecidas e sensação de evacuação incompleta.

O USO INDISCRIMINADO DE LAXANTES POR PESSOAS QUE ACHAM QUE SOFREM COM O INTESTINO PRESO PODE, NA VERDADE, DESENCADEAR O PROBLEMA

8. Emoções são capazes de 'prender' o intestino.
Sabe-se que as emoções influem na atuação do sistema nervoso, em especial do nervo vago, que, por sua vez, estimula a função do aparelho digestivo. Ou seja, a pessoa sofre uma alteração de sensibilidade por questões emocionais e passa a ter uma percepção distorcida dos fenômenos fisiológicos do intestino. Assim, as contrações intestinais, que antes eram imperceptíveis, passam a ser traduzidas pelo sistema nervoso como desconfortáveis, gerando diarréia ou prisão de ventre, além de cólicas. Essas alterações psicossomáticas, acreditam os especialistas, podem ter relação com o estresse emocional e até com a sexualidade - uma violência ou desejo reprimido.

9. A má alimentação é uma das principais responsáveis pelo mal. Normalmente, a prisão de ventre é resultado da pouca ingestão de líquidos e de um cardápio pobre em fibras. Mas as causas por trás do distúrbio são diversas. Podem ser funcionais (motivada por dieta inadequada, uso de laxantes e contração dos estímulos involuntários de evacuação) ou orgânicas (associadas a alguma patologia). Outros fatores também costumam desencadear ou agravar o problema, tais como sedentarismo, idade avançada, obesidade, diabetes, gravidez, tumores, efeitos colaterais de medicamentos (como antidepressivos, calmantes e remédios para emagrecer), distúrbio no me tabolismo de cálcio, intoxicação pelo chumbo, hérnias internas, doença de Chagas e abuso de laxantes. Por isso, só o médico é capaz de fazer um diagnóstico preciso.

10. O uso de supositórios na infância não leva à constipação.O fato de o medicamento ser aplicado por via anal não interfere no mecanismo de evacuação do corpo. Além disso, o supositório pode ser usado em crianças, inclusive, para tratar problemas de intestino.

11. Há alimentos que melhoram o funcionamento intestinal.
Sim, especialmente aqueles ricos em fibras insolúveis (ou seja, cerea is integrais, como aveia, trigo, pães, massas e arroz). Eles atuam como laxantes naturais. Como retêm líquidos, essas fibras atuam no intestino grosso aumentando o volume e diminuindo a consistência das fezes, o que favorece o trânsito intestinal e, conseqüentemente, a evacuação. A quantidade necessária de fibras alimentares recomendada ao ser humano é de 25 a 40 gramas por dia, sendo 70% de fibra insolúvel e 30% de fibra solúvel (encontrada especialmente em frutas e verduras).
Outros alimentos ricos em fibras são os alimentos oleaginosos (avelã, amêndoa e noz) e sementes (gergelim e frutas). Mas atenção: o consumo excessivo de fibras também pode ser prejudicial à saúde.

12. Há produtos industrializados que ajudam no tratamento.
Estudos mostram que os alimentos probióticos, que contém microrganismos vivos adicionados à fórmula, melhoram o trânsito intestinal. O mesmo vale para os suplementos de fibras. Mas é importante que se diga que a alta prevalência de constipação intestinal tem a ver muito mais com a retirada das fibras de alguns alimentos industrializados, especialmente do arroz, milho e trigo. As empresas tiram a casca (rica em fibras) para conservar os grãos vendidos ensacados ou enlatados. Não é por acaso que a prisão de ventre é um problema essencialmente urbano. No ambiente rural, as pessoas que consomem muito mais produtos in natura, dificilmente têm intestino preso.
13. O uso de laxantes naturais é extremamente perigoso.
Aliás, de qualquer laxante. As substâncias liberadas no preparo de chás com folhas de sene, cáscara-sagrada e ruibarbo, por exemplo, são muito agressivas às mucosas intestinais. Elas irritam a parede do intestino e interferem em sua sensibilidade. Além de lesar a parte final do tubo digestivo, a ingestão prolongada desses 'laxantes naturais' torna-os menos eficazes e agrava a prisão de ventre. Isso porque, à medida que a pessoa toma quantidades maiores desses chás em intervalos menores de tempo, há riscos sérios de desequilíbrio da concentração de sais minerais no organismo e até desidratação.

14. Intestino preso não necessariamente leva ao câncer.
O câncer de intestino ou colorretal depende de uma predisposição genética. Isto é, pessoas que não têm casos desse tipo na família - a maioria - dificilmente apresentarão a doença, mesmo que sigam hábitos alimentares inadequados e apresentem prisão de ventre. Portanto, a dieta pobre em fibras pode ser no máximo um fator desencadeante, mas não o único causador deste tipo de câncer.

15. A gravidez pode colaborar.
Pesquisas apontam que mais de 30% das gestantes têm prisão de ventre. Isso porque a mulher passa por uma transformação hormonal durante esse período que retarda o processo de evacuação. Paralelamente, há uma pressão do útero sobre o intestino, que também contribui para o atraso na eliminação das fezes. Além disso, a gestante retém mais líquido na gravidez, tornando as fezes mais secas e dificultando sua passagem pelo intestino. O consumo de líquido e de fibras naturais é ainda mais essencial nessa fase, mas, em situações agudas, os médicos podem até recomendar o uso de medicamentos específicos que melhoram o funcionamento do intestino, sem comprometer o desenvolvimento do bebê.

16. Deixar de ir ao banheiro não engorda.
Depois que os alimentos se transformaram em fezes (mesmo que elas demorem a ser formadas e expelidas), eles deixam de ser absorvidos e, portanto, não podem mais ser convertidos em gordura.
17. Fazer exercícios ajuda.

Atividades físicas regulares (três vezes por semana, durante pelo menos 30 minutos) estimulam os movimentos do intestino, favorecendo a eliminação das fezes.

18. A constipação intestinal provoca espinhas.
De certa forma. As substâncias tóxicas, que o organismo tem dificuldade de eliminar pelas fezes, acabam sendo expelidas pelo corpo em forma de espinhas. Mas isso não significa que as pessoas têm de sair tomando laxante para manter a cútis lisa e sem marcas. As acnes podem não ter nada a ver com os problemas intestinais. E, mesmo que tenham, a ansiedade em melhorar a aparência com um estalar de dedos só irá agravar o quadro.

19. Há exames específicos para confirmar o diagnóstico.
Para fazer uma avaliação correta da existência ou não do distúrbio há três testes indicados:

1) Tempo de trânsito colônico: o paciente toma uma cápsula e, a partir do percurso dela no organismo, o médico é capaz de dizer o tempo necessário para que os alimentos se transformem em fezes e sejam eliminados.
2) Videodefecografia: utiliza contraste pelo reto para análise do mecanismo da evacuação do intestino.
3) Manometria anorretal: avalia com trações e reflexos responsáveis pela evacuação
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Fonte: Revista Viva Saúde

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