Um dos
principais temas da vida e dos livros da escritora americana Debbie Ford (1955-2013)
foi a popularização do tema da “sombra“, conceito criado pelo psicólogo suíço Carl
Gustav Jung, e que ela explorou bastante no livro “O Lado Sombrio dos
Buscadores da Luz” (The Dark Side of The Light Chasers, 1998). É uma obra
naturalmente introdutória mas bastante interessante e riquíssima em exemplos de
como nossa sombra aparece e se projeta no mundo (e nos outros), no relato das
experiências pessoais da autora e na citação de outros autores que exploraram o
tema. Em virtude do seu falecimento em 18/02/2013, de câncer, aos 57 anos,
selecionei 7 trechos dessa obra que li há muito tempo, mas que lembro
ter elucidado com simplicidade e facilidade esse tema absolutamente essencial
para o crescimento de qualquer pessoa, sem exceções.
Seguem os
trechos de “O Lado Sombrio dos Buscadores da Luz” (Cultrix):
[1] “Meu
amigo Bill Spinoza, um instrutor de grupo de estudos superiores da Landmark
Education, diz: “Aquilo com que você não consegue coexistir não o
deixará existir ”. Você precisa aprender a deixar que tudo o que você
é exista. Se quiser ser livre, antes de tudo tem de “ser”. Isso significa que
precisamos parar de nos julgar. Devemos nos perdoar por sermos humanos,
imperfeitos. Porque, ao nos julgar, estamos automaticamente julgando os
outros. E o que fazemos com os outros fazemos com nós mesmos. O mundo é um
espelho de nós mesmos. Quando conseguimos nos aceitar e nos perdoar, fazemos a
mesma coisa com os outros. Essa foi, para mim, uma dura lição a ser aprendida.
[2] A
maioria das pessoas tem medo de encarar e assumir o seu lado sombrio, mas é lá
na escuridão que você encontrará a felicidade e a sensação de estar completo
com que vem sonhando há tanto tempo. Quando você usa o seu tempo para se
descobrir por inteiro, abre as portas do verdadeiro esclarecimento. Uma das
armadilhas da Era da Informação é a síndrome do “já conheço isso”. Com
freqüência, o conhecimento nos impede de viver a experiência em nosso coração.
O trabalho com a sombra não é intelectual; é uma viagem da mente ao coração.
Diversas pessoas que trilham o caminho do aperfeiçoamento individual acreditam
que completaram o processo, mas são incapazes de enxergar a verdade sobre si
mesmas. Muitos de nós almejam ver a luz e viver na beleza do seu eu mais
elevado, mas tentamos fazer isso sem integrar todo o nosso ser. Não
podemos ter a experiência completa da luz sem conhecer a escuridão. O lado
sombrio é o porteiro que abre as portas para verdadeira liberdade. Todos devem
estar atentos para explorar e expor continuamente esse aspecto do ser. Quer
você goste ou não, sendo humano, você tem uma sombra. Se não consegue vê-la,
pergunte a alguém da família ou às pessoas com quem trabalha. Elas vão
indicá-la para você. Pensamos que nossas máscaras mantêm nosso eu interior
escondido, mas, todas as vezes que nos recusamos a reconhecer aspectos nossos e
quando menos esperamos, ele dá um jeito de erguer a cabeça e
fazer-se conhecido.
[3] A
projeção é um fenômeno fascinante que a grande maioria das escolas deixa de
ensinar aos estudantes. É uma transferência involuntária do nosso próprio
comportamento para outras pessoas, dando-nos a impressão de que determinadas
características estão presentes nos outros. Quando sofremos de ansiedade no que
diz respeito às nossas emoções ou partes inaceitáveis da nossa personalidade,
atribuímos esses aspectos – como um mecanismo de defesa – a objetos exteriores
a nós ou a outras pessoas. Quando somos intolerantes com as outras pessoas, por
exemplo, estamos inclinados a atribuir nosso sentimento de inferioridade a
elas. Evidentemente, há sempre um “gancho” que favorece nossa projeção. Alguma
qualidade imperfeita em outra pessoa ativa uma parte de nós mesmos
que quer nossa atenção. Dessa forma, tudo o que não assumimos em relação a
nós mesmos projetamos em outras pessoas.
[4]Instintivamente, nós recuamos diante de nossas projeções negativas. É mais fácil
examinar aquilo que nos atrai do que aquilo que nos causa aversão. Se fico
aborrecido com sua arrogância, é porque não estou assumindo a minha
própria. Isso também é arrogância, que agora estou demonstrando sem perceber,
ou a arrogância que renego, a qual serei capaz de demonstrar no futuro. Se fico
aborrecido com a arrogância, preciso examinar bem de perto todos os recantos da
minha vida e me perguntar o seguinte: no passado, quando fui arrogante? Estou
sendo arrogante neste momento? Pode acontecer que eu me comporte com arrogância
no futuro? Com certeza eu estaria sendo arrogante se respondesse não a essas
perguntassem me examinar com cuidado ou sem perguntar a outras pessoas se
alguma vez me viram agindo com arrogância. O ato de julgar alguém é arrogante;
portanto, evidentemente, todos temos a capacidade de ser arrogantes. Se eu
incorporar minha própria arrogância, não me aborrecerei com a dos outros. Vou
percebê-la, mas ela não me afetará. A tomada da minha arrogância estará
envolvida por uma chapa de proteção. Só quando você mente para si mesmo
ou odeia alguma característica sua é que recebe uma carga emocional originada do
comportamento de outra pessoa.
[5] Nossa
carapaça exterior é que enfrenta o mundo, escondendo as características que
constituem sua sombra. Nossas sombras são tão bem disfarçadas que, muitas vezes,
mostramos uma face para o mundo quando, de fato, é o extremo oposto que
realmente está dentro de nós. Algumas pessoas usam uma camada de agressividade,
que esconde sua sensibilidade, ou uma máscara de humor, para cobrir sua
tristeza. As pessoas que “sabem tudo” normalmente estão disfarçando o fato de
se sentirem burras, enquanto que as que agem com arrogância precisam ainda
revelar sua insegurança. A pessoa gentil, esconde o canalha dentro de si, e a
sorridente oculta a irritada. Precisamos olhar além de nossas máscaras sociais
para descobrir nosso eu autêntico. Somos mestres do disfarce, enganamos os
outros, mas nos enganando também. São as mentiras que contamos a nós mesmos que
temos que
decifrar. Quando nunca nos sentimos completamente satisfeitos, contentes, saudáveis ou
realizando nossos sonhos, é porque essas mentiras estão no nosso caminho. É
assim que reconhecemos nossa sombra, quando a trabalhamos.
[6] A
maioria das pessoas almeja encontrar a paz de espírito. Essa é a busca de uma
vida, uma tarefa que requer nada menos do que aceitar a totalidade do
seu ser. Descobrir benefícios até nas qualidades que mais odiamos é um processo
criativo que necessita apenas do desejo profundo de ouvir e aprender, da
vontade de liberar crenças e juízos anômalos e da prontidão para se sentir
melhor. Seu verdadeiro eu não julga. Somente o ego guiado pelo medo
cria juízos para nos proteger – proteção essa que, ironicamente, nos impede de chegar à
realização pessoas, Precisamos estar preparados para amar tudo aquilo de que
temos medo. “Meus ressentimentos escondem a luz do mundo”, como está escrito
em Um Curso em Milagres.
[7] Um
velho mestre diz: “O mundo é um professor para o sábio e um inimigo para o
tolo”. Nenhum acontecimento é doloroso em si e por si mesmo; tudo é uma questão
de perspectiva. É importante compreender que tudo o que acontece
no mundo é exatamente como deveria ser. Não há erros nem acidentes. O
mundo é um céu paradisíaco e um abismo sem fundo. Quando compreendemos que não
podemos ter um sem ter o outro, fica mais fácil aceitar o mundo como ele é.
Olho para o meu passado cheio de mentiras e de ilusão, dor e mágoa, drogas e
sexo, mas sei que, sem todas essas experiências e a escuridão que me acompanhou
durante tanto tempo, eu não teria sido capaz de ensinar como faço hoje. Todos os
incidentes do meu passado, as noites insones, as lágrimas derramadas me deixam
um pouco mais perto de cumprir a jornada da minha alma. Ninguém diz aquilo que
digo da mesma maneira que eu. Ninguém faz as coisas que faço do mesmo jeito que
eu. Eu sou eu e você é você. Cada um de nós é único, e todos nós temos uma
jornada própria especial.
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